BLOG DE ESQUERDA

POLÍTICA, CULTURA, IDEIAS, OPINIÕES, MANIFESTOS E ETC. (envie os seus contributos, dúvidas e sugestões para o blog_de_esquerda@hotmail.com)Este blog é mantido por José Mário Silva e Manuel Deniz Silva.

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25.11.03
 



FINAL (OU APENAS O PRINCÍPIO DE OUTRA COISA). É hoje. É agora. Após quase 11 meses, decidimos mudar. Mudar de endereço. Mudar de template. Mudar de equipa. Ou melhor, quisemos criar uma verdadeira equipa. Em vez dos manos Silva, com as suas idiossincrasias e obsessões, teremos sete bloggers no activo: os sócios fundadores do BdE (salvo seja), mais os distintos companheiros que dão pelo nome de Francisco Frazão, Frederico Ágoas, Margarida Ferra, Marta Lança e tchernignobyl. Alguns já são conhecidos dos nossos leitores, outros ficarão rapidamente a ser.
E agora o link mais importante que alguma vez fizemos:

http://bde.weblog.com.pt

É este o novo endereço do Blog de Esquerda. Melhor dizendo: do BdE - Blogue de Esquerda (II). A todos os leitores e amigos, pedimos desde já a substituição do endereço nos Favorites e nos linques dos blogues.
A "ordem natural das coisas" determina que a segunda versão do BdE deve ser melhor do que a primeira. Nós, laboriosamente como os «Raboteurs de parquet» de Gustave Caillebotte (esses operários que afagam o chão num dos mais belos quadros da ala impressionista do Musée d' Orsay), tudo faremos para não desiludir os nossos leitores.
Prometemos sobretudo trabalho. Suor, dedicação, tempo. Que a sorte também nos traga algum engenho, alguma arte.
Até já.

PS: Por tudo o que de bom nos trouxe este blogue e o convívio na blogosfera, milhares de pequenas coisas que seria fastidioso enunciar, o nosso infinito obrigado.

24.11.03
 
AMANHÃ. A data é um bocado sinistra: 25 de Novembro. Mas algum dia tinha que ser. Se não surgirem dificuldades de última hora, amanhã recomeça, noutro lugar, a vida deste blogue.

 
INTELECTUAIS. Pergunta Eduardo Prado Coelho, na sua crónica de hoje: «Precisamos ainda de intelectuais? Claro, a resposta é sim. Mas como funcionam eles em tempo de blogues?» Elementar, meu caro EPC: em tempo de blogues, os intelectuais criam um. De que é que está à espera?

 
SOBRE A SOLIDARIEDADE QUE POR VEZES FALTA À ESQUERDA. «PCP contra petição para despenalização do aborto». Não é preciso dizer mais nada, pois não?

 
O ESTÁDIO VAZIO. No Algarve, inaugurou-se mais um estádio do Euro-2004, orçado em 35 milhões de euros. Mas, muito à portuguesa, nem sequer um joguito entre equipas amadoras se arranjou para a estreia. Ou seja: no estádio novinho em folha, todo giraço e práfrentex, não houve equipas a correr nem golos (embora tenha havido muita política, do subgénero corta-fitas). Ali, preto no branco, diante do friso engravatado dos ministros e autarcas, estava uma antecipação do que acontecerá ao elefante branco do Vale da Venda, logo após o Europeu: terá futebol a menos e bancadas a mais.

 
GEÓRGIA ON MY MIND. Gosto de revoluções sem sangue: bandeiras ao alto, multidões na rua, flores oferecidas aos soldados. Mas não gosto de as ver associadas ao veludo, esse tecido burguês. Uma revolução a sério tem asperezas, passos em falso, contradições, arestas. Uma revolução digna desse nome não pode ser de veludo; quando muito, que seja de serapilheira ou pano-cru.

23.11.03
 
DOGVILLE. Quase não falámos aqui no BdE do último filme de Lars von Trier. E, no entanto, teríamos gostado de entrar no princípio de polémica que passou pela blogosfera (ver aqui e aqui). Voltaremos ainda a este filme, sem dúvida. Para já, transcrevemos uma crítica do nosso amigo Pedro Rodrigues que, na sua coluna do Combate, nos continua a espantar com o seu olhar livre e pertinente sobre o cinema.


“Dogville”
de Lars Von Trier

Jogo cão

Cidade de cães. Homens cães e mulheres cães. E um cão. Numa terrinha americana, território da moral e dos bons costumes, uma Graça vem perturbar tudo. Não, não é a nova ministra da educação: é Nicole Kidman, que é Grace.
A vilória é um tabuleiro, e a vida um jogo. Grace vem de fora. Mas deste "fora" só se sabe que há polícias e bandidos. Só resta ao espectador uma hipótese. Entrar ou não entrar no jogo. E entra-se. Basta não sair da sala.
Tudo se passa às claras (para quem vê). As portas e as paredes das casas não estão lá. Só o barulho das portas. É uma espécie de Big Brother: há até as reuniões da "comunidade" onde se discute sobre se Grace sai ou fica em Dogville. Mas é um Big Brother mais erudito. A música barroca aparece de vez em quando para nos lembrar disso. Mas será que tudo se passa mesmo às claras?
De onde vem essa música, por exemplo? De onde vem a voz do narrador, ao mesmo tempo pregadora e irónica? Pede-se ao espectador que entre no jogo. Mas quem fez esse jogo? Quem inventou as regras e para quê?
Para fazer uma "ilustração". Para, com um exemplo "típico" (embora caricaturado) de uma certa moral e de uma certa "civilização", mostrar as hipocrisias dessa moral, mostrar as duas faces da mesma moeda, onde se juntam Bem e Mal. Lars Von Trier põe-se nessa posição (quase invisível) de pregador de uma nova moral, que denuncia a que reina em Dogville. Põe em questão, aparentemente, os fundamentos dessa moral: a palavra e a argumentação, a ideia de "planificar" a acção, a racionalidade, a educação ("eu acredito na educação", diz a certa altura uma das habitantes, mãe de filhos com nomes de deuses greco-latinos). É também a moral da culpa/desculpa, do certo/errado, do crime/punição. Grace vem perturbar, porque é menina rica e citadina. Tem a "arrogância" de ser paternalista e desculpabilizadora em relação aos outros. Acaba por "encaixar" (de maneira perversa) em Dogville. E aprende uma lição, que é a que Trier quer que todos aprendam. Que o ser humano é "mau" e cão.
Quem inventou as regras foi Trier e o tom de Trier é ainda moralista, mas já duma outra moral. Envolve o espectador (apesar da divisão em capítulos, apesar das ironias, apesar do tabuleiro) para lhe impingir a sua tese. A representação regressa estranhamente a um novo naturalismo (há quem prefira dizer "underacting"), e procura um intimismo baseado nos sussurros de Kidman e na proximidade da câmara, além do uso banalíssimo e tradicionalíssimo da música. A câmara na mão e a montagem com saltos bruscos tornou-se (já era) o tique do artista, a sua imagem de marca.
O problema é que as velharias de Trier usam coisas novas e vêm com a aparência do novo e do radical. É essa a sua lição de marketing: provocatório à superfície e nos temas, inovador pelos tiques, ilusório e naturalista com uns pós de distância e ironia. E descobriu a pólvora: conciliar os seus jogos morais com o star system americano, "cinema de autor" que sabe alargar a sua fatia de mercado.
As contradições de Trier jogam-se aí: querer afrontar a moral fazendo "ilustrações" morais, ter a côdea arrojada e o miolo conservador. Obcecado pelo Bem e pelo Mal, Trier não consegue sair desse jogo onde se fecha (também não há saída de Dogville, é preciso voltar para trás...). Anda às voltas com o seu existencialismo soluçante.
O que ele adora, no fundo, é ver a Kidman sussurrando meio chorosa, filmada em tremelique com o Bach a acompanhar. Às vezes não há pachorra.
(Pedro Rodrigues)

 
FRIEDRICH.




A verdade é que não sei explicar muito bem porque gosto tanto das telas de Caspar David Friedrich. Mas gosto. Gosto das paisagens agrestes, dos cumes da montanhas, das capelas perdidas em bosques sombrios, dos cemitérios varridos pela neve, das ruínas ao crepúsculo e dos campos no momento em que são tocados pela primeira luz da manhã. Há neles uma honestidade tremenda (ia dizer franqueza). Aquelas brumas podem ser hiper-românticas, mas são também absolutamente reais. Olho e respiro-as; vejo e sinto no rosto um vento frio.





E depois há a presença humana: sempre dúbia, sempre esmagada pela natureza. O homem apaga-se diante do mar, das nuvens ou dos gelos eternos. A paisagem reflecte estados de alma (lembram-se de Garrett, nas «Viagens...», deambulando pelas charnecas do Ribatejo?), espelha o turbulento vórtice de ideias do homem romântico, a fúria de compreender a lógica mais secreta do mundo, a essência do Sturm und Drang. A existir uma banda sonora para estas imagens, seria Schubert.





Um dos aspectos mais fascinantes da pintura de Caspar David Friedrich é este: as figuras humanas estão sempre de costas. Elas vêem o mesmo que nós, ou o que nós gostaríamos de ver. Pertencem ao lado de , não fazem parte de um retrato. São projecções do olhar do pintor, fantasmas sem face, espectadores aleatórios que ficaram, quase por acaso, dentro do enquadramento. Como se tivessem sido apanhados de surpresa, à revelia da sua vontade. Ou então talvez estejam de costas porque se recusam a devolver-nos o olhar. Não sei. Não sei se há nisto uma desistência ou a primeira sombra da despedida.

22.11.03
 
RÂGUEBI. Acabou hoje, com um travo amargo para mim, a Taça do Mundo de Râguebi, disputada nos ântipodas (Austrália) e por isso entrevista fugazmente pela televisão, uma vez que os jogos se disputavam quase de madrugada (nove horas da manhã, desculpem lá, é madrugada). Na final, em Sydney, venceu a Inglaterra, que se tornou a primeira selecção europeia a trazer o troféu para o Hemisfério Norte. O travo amargo não se deve apenas ao colapso da França (a minha selecção) nas meias-finais e no jogo para a atribuição do terceiro lugar, depois de um percurso simplesmente brilhante nas fases iniciais da competição. O travo amargo deve-se sobretudo ao facto de ver o râguebi, o desporto colectivo por excelência, reduzido à eficácia mecanicista de Jonny Wilkinson, um médio de abertura que mais parece um robot (genial, mas robot) capaz de destruir as defesas adversárias à custa de drops. A Inglaterra foi a equipa mais forte e mereceu a vitória – sobre isso não restam dúvidas. Mas não consigo bater palmas, nem entusiasmar-me, com um XV campeão que é Wilkinsondependente e só marcou um ensaio nos dois últimos jogos. Acham que alguém vibraria com uma vitória do Brasil, no Campeonato do Mundo de Futebol, obtida apenas com golos (e a maioria de penalty) do Mário Jardel? Não me parece.

 
MERIDIANOS ESTRANGEIRADOS. Querem mais dois blogues muitíssimo recomendáveis? Então anotem. Há (uns) meridianos à maneira, onde pontifica mais um "filho" do BdE (a prole parece inesgotável), de seu nome Abel Campos. E há o excelente Estrangeirados, escrito em Paris por Bruno Manteigas e em Londres pelo João Cepeda, que, sobre ser um bom jornalista (e agora correspondente do DN no Reino Unido), foi um fraterno camarada de redacção. Sejam bem-vindos.

 
LANÇAMENTO. Na próxima segunda-feira, pelas 19 horas, na livraria Ler Devagar (Bairro Alto), é lançado o livro «Fogo sobre os Media», de Francisco Ferrándiz (professor da Universidade de Deusto, em Bilbao) e José Manuel Pureza (professor da Universidade de Coimbra). O livro reúne comunicações apresentadas em dois colóquios internacionais promovidos pela HumanitarianNet sobre a temática do relacionamento entre
media e conflitos armados. A apresentação estará a cargo do jornalista Adelino Gomes e do Prof. José Paquete de Oliveira (ISCTE).

21.11.03
 
VERSOS QUE NOS SALVAM. Ainda quente, acabadinho de sair da gráfica, o novo livro de um poeta que já andou pela blogosfera (nos saudosos Intrusos): Mário Rui de Oliveira, também um excelente tradutor de Tonino Guerra. O volume, com pouco mais de 50 páginas, intitula-se «Bairro Judaico» (Assírio & Alvim). Na capa, a imagem de um fresco. Vemos um anjo precário, a pairar numa parede vermelha. Lá dentro, nos poemas, fala-se de destroços e paisagens, memórias e flores brancas, música e Deus, Jerusalém e a «cinza sempre inacabada» da epígrafe de René Char. Há por aqui, sobretudo, uma espécie de luz ferida. Oiçam-na.


NEGRO CREME AZUL

A Eugénio de Andrade


A conversa era sobre pássaros
dizias a defender-te de ti próprio
o gaio é mais belo do que o melro
negro creme azul

bem desejavas não tremer quando
subias a um lugar que deixamos
no mais alto
com os ninhos

arrancavas uma flor
o gesto mais inocente
e por te sentires perdido
oferecias-ma

não sabias o que acordavas
por isso lancei-a ao mar
como verdade que mete medo



© Mário Rui de Oliveira

PS: Vozes amigas recordam-nos que o poeta Mário Rui de Oliveira não abandonou a blogosfera. Com os restantes Intrusos, limitou-se a mudar de poiso. Agora, deixa as suas palavras no caderno graficamente exemplar de um Companheiro Secreto.

 
EFÍGIES & ESFINGES. Eu ouvi. Juro que ouvi. O jornalista desportivo, naquele afã de dizer tudo num segundo, a correr, confundiu as duas palavras. Em vez de efígie, disse esfinge. Tragédia maior do nosso tempo: a ignorância à solta, transformada em lugar-comum.

 
REDUNDÂNCIAS. «Servi a Pátria e Acreditei no Regime», diz Rosa Casaco no título do seu livro de memórias. Como se nós não soubéssemos.

 
LIVROS, HUMOR E CORRUPÇÃO NO "É A CULTURA, ESTÚPIDO!" (PUB). Vai ter lugar no próximo dia 26 de Novembro, quarta-feira, às 18h30, no Jardim de Inverno do Teatro São Luiz, mais um encontro sobre livros e escritores. Depois de António Mega Ferreira – que inaugurou o novo ciclo de encontros –, o convidado do segundo "É a Cultura, Estúpido!" é Gonçalo M. Tavares, um dos mais criativos e produtivos escritores da nova geração, autor de, entre outros livros, "O Senhor Henri", "O Senhor Valéry" e do recém-editado "Um Homem: Klaus Klump" (todos da editorial Caminho). A equipa mantém-se – a jornalista Anabela Mota Ribeiro, os críticos literários José Mário Silva e Pedro Mexia, os jornalistas João Miguel Tavares e Nuno Costa Santos, os colunistas Daniel Oliveira e Pedro Lomba e o stand-up comediant Ricardo de Araújo Pereira. Quem passar pelo Jardim de Inverno poderá, por exemplo, saber "O Que Não Andam a Ler" os críticos, conhecer as sugestões de "Baixa Cultura" dos jornalistas, ouvir a crónica humorística sobre a actualidade literária e assistir a um debate a partir do livro "O Inimigo Sem Rosto – Fraude e Corrupção em Portugal", de Maria José Morgado e José Vegar (Dom Quixote).
O "É a Cultura, Estúpido!", evento organizado pelas Produções Fictícias, continuará a realizar-se até Junho de 2004, nas últimas quartas-feiras do mês, no Teatro Municipal São Luiz.


20.11.03
 
HORROR. Na EuroNews, vejo em silêncio imagens dos atentados de Istambul. Prédios destruídos. Ruínas. Pessoas em estado de choque, com a cabeça e as mãos cheias de sangue. Do ar, um helicóptero sobrevoa a desgraça. Visão terrível. Mais prédios destruídos, mais ruínas, mais sangue. Como se por ali tivesse passado a sombra negra de um terramoto. Só que não foi um terramoto. Foi uma mistura de ódio e explosivos. Perante uma coisa destas, ao pensar nos autores do atentados, o que sinto não é repúdio. É repulsa.

 
UM BLOGUE TEATRAL. Não sei se conhecem estes rapazes:



Se não conhecem, eu apresento-os. Da esquerda para a direita: Tiago Rodrigues, Luís Filipe Borges e Nuno Costa Santos. Por acaso, são meus amigos. Por acaso, até escrevem todos no Desejo Casar. Por acaso, estão os três envolvidos num espectáculo teatral com um título brilhante («Stand Up Tragedy»), escrito pelo Luís Filipe e pelo Nuno, interpretado pelo Tiago. Por acaso, decidiram fazer um blogue sobre a montagem da peça, os ensaios, as angústias de quem escreve e de quem representa, os avanços e recuos, as histórias que ficaram de fora, as alegrias, os medos e tudo o que se passa nos bastidores e nas cabeças deles. Por acaso, o blogue está aqui e nele se faz, diariamente, a arqueologia dramatúrgica de um texto. Por acaso, o espectáculo vai estrear dentro de meia hora, no Teatro Maria Matos – onde ficará em cena até 14 de Dezembro, de quarta a sábado (21h30) e aos domingos (18h00). Por acaso, suspeito que vai ser muito bom.
Por acaso, nada disto é por acaso.

 
CHAMAS. Nas traseiras do jornal onde trabalho, há um pequeno quartel de bombeiros. E nesse quartel, ao fim de uns quantos lanços de escadas que parecem sempre intermináveis, há um pequeno restaurante. Uma espécie de tasca, com mesas de fórmica, guardanapos de papel, meias doses e preços baixos (em tempos, também sobrava espaço para um jogo de matraquilhos, onde só se podia jogar depois das três; agora já não). É ali que eu almoço às vezes, um bacalhau cozido ou uma cabidela, por entre a vozearia dos grupos que descem ritualmente dos seus escritórios e alguns tresmalhados jovens com pinta de estudarem no Chapitô. De quando em quando, ouvem-se sirenes. Nas paredes, fotografias a preto e branco, picadas pelo tempo, com homens agitando vetustas agulhetas junto a carros do princípio do séc. XX. E, em lugar de destaque, uma imagem a cores, muito ampliada. Hoje, não sei porquê, essa imagem perturbou-me. Mostra a fachada do Teatro D. Maria II, no dia do famoso incêndio. Lá em cima, no telhado, uma frente de chamas vermelhas e amarelas. Cá em baixo, no Rossio, vários veículos dos bombeiros e uma enorme escada Magirus, em cujo topo alguém aponta, directo ao coração das labaredas, um muito branco jacto de água. Enquanto mastigava, pensei no efeito irónico daquele fogo emoldurado. O que noutro lugar seria apenas uma tragédia, aqui é uma coroa de glória.

19.11.03
 
QUESTÃO DE PRESTIGE. A verdadeira história do naufrágio do petroleiro Prestige, ao largo da Galiza, ainda está por contar. Pressente-se que existem muitas questões nebulosas, movediços cenários económicos, obscuras jogadas políticas, cortinas de fumo, irresponsabilidades, cobardias, álibis. Enquanto isso, a realidade, nas praias galegas, continua a ser negra. Negra como o crude. Porque a poluição persiste. Porque o navio afundado é uma bomba-relógio.
Um ano após a tragédia, vale a pena espreitar aqui algumas das ligações perigosas em torno deste caso. E pasmar com a criatividade dos artistas que apoiaram o movimento «Nunca Máis», como este Colectivo Chapapote – a cujo site fomos buscar a belíssima (e terrível) ilustração de Miguelanxo Prado que abaixo se reproduz.



 
MANIFS. Disse há uns dias Pacheco Pereira: «Tanto quanto eu saiba, manifestações da esquerda em Portugal nunca houve contra Kadafi (pelo contrário, houve quem recebesse dinheiro dele), contra a dinastia norte-coreana, contra Cuba, contra o Hamas, contra Saddam. Só me recorda haver contra os EUA e com cartazes a dizer "Bush assassino e terrorista"». Este é um argumento recorrente. Já o tinha ouvido na altura das mega-manifestações contra a guerra, voltei a ouvi-lo como um estribilho nas monolíticas argumentações dos blogues de direita. De todas as vezes, só me apeteceu responder assim: «Pois é, têm toda a razão. A esquerda não se manifestou contra Kadafi, o Hamas e Saddam. Mas e vocês? Por que raio é que a direita, aparentemente tão preocupada com o povo líbio, israelita e iraquiano, mais a liberdade e a democracia, não se manifestou? Alguém a impediu? Não, pois não? Então deixem de nos moer o juízo, por favor».

 
NOVOS BLOGUES. São muitos, a merecerem visitas demoradas e atenção. Deixamos aqui a referência de alguns que nos agradaram mesmo. Mas há mais.


Bologna Nihil - Tem haikus e contra-haikus, muitos textos sobre temas culturais, sociais e políticos, além de uma manifesta dificuldade no uso dos acentos. Segundo os próprios, que se assumem como «um anarquista e um comunista à procura de companhia», a ideia é dar «notícias de Bolonha, Itália e Berlusconi», junto com «visões do mundo entre o dandysmo e a dinamite».

Via da Verdade - Um excelente «Blog de Filosofia & Literatura» (embora um pouco denso para não-iniciados), pelo mesmo autor do Folhetim Iluminados.

Laranja Amarga - Excelente ritmo, posts curtos, estilo incisivo, humor mordaz (e ainda por cima são de esquerda).

Quase em Português - Curiosa página de Lutz Brückelmann, um alemão que se descreve como «imigrante», «arquitecto» e «pai de família». O blogue, esse, tem um ligeiro sotaque. E Lutz diz que é «sobre tudo».

Miniscente - Hiper-activo blogue do escritor Luís Carmelo.

Tabaco só ao Balcão - Frases soltas (com erros ortográficos), slogans, palavras escritas em muros e montras de lojas, memorabilia verbal do nosso tempo.



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